Dezessete anos após a morte de Candido Portinari, o jornal O Globo publicaria: "Portinari, o pintor. Um famoso desconhecido. Mais de 95% da obra do maior pintor brasileiro contemporâneo hoje é inacessível ao público, guardada em coleções particulares. O que foi feito do trabalho de um homem que, durante toda a sua vida, exprimiu emocionadamente a alma, o povo e a vida brasileira?". O escritor Antonio Callado já havia denunciado também: "...Segregado em coleções particulares, em salas de bancos, Candinho se vai tornando invisível. Vai continuar desmembrado o nosso maior pintor, como o Tiradentes que pintou?"
O Projeto Portinari foi criado em 1979. Seu fundador e até hoje diretor-geral, o professor João Candido Portinari, dirigindo-se ao pai em carta-prefácio póstuma, que introduz a primeira publicação do Projeto Portinari, declarou: "é como brasileiro que me sinto no dever de trabalhar para que todos possamos nos reencontrar com tua obra e, através dela, com nós mesmos".
Inicialmente direcionado ao resgate sistemático, minucioso e abrangente da vida e da produção artística de Candido Portinari, assim como do contexto histórico em que ele viveu, o projeto busca, igualmente, integrar a obra do artista no serviço de um propósito mais amplo: a busca da nossa identidade cultural e a preservação da memória nacional. Da mesma forma, almeja contribuir para uma ação sociocultural abrangente, visando aprimorar a compreensão do processo histórico e cultural brasileiro.
Considera ainda o Projeto Portinari como uma de suas missões mais importantes, trabalhar para a democratização do legado pictórico, ético e humanista do pintor. Empenha-se, ainda, em exercer uma atuação voltada especialmente a crianças e jovens, tomando por base os valores sociais e humanos presentes em todo o universo “portinariano”, para suscitar uma reflexão sobre a realidade brasileira e mundial. Assim, Antonio Callado sentiu e descreveu a iniciativa pioneira do Projeto Portinari: “Na casa do arquiteto francês Grandjean de Montigny, há um trabalho de amor e técnica que fixa para a posteridade a obra de Portinari... Pessoalmente ainda não vi, no Brasil, um trabalho tão minucioso e tão inteligente para manter viva a memória de um artista... um projeto que constitui um marco histórico: é assim que um país se firma nas suas raízes culturais...”
O acervo do Projeto Portinari é resultado do levantamento e catalogação de mais de 5.200 obras e 30 mil documentos relacionando-os entre si, e com as obras. Entre esses documentos, encontram-se 6 mil correspondências, 12 mil recortes de jornais e periódicos, 2.900 fotografias de época, depoimentos, catálogos de exposições e de leilões e textos.
Em seu Programa de História Oral, registrou 70 depoimentos, totalizando 130 horas gravadas. Carlos Drummond de Andrade, Oscar Niemeyer, Lúcio Costa, Luís Carlos Prestes, Jorge Amado, Afonso Arinos, Raul Bopp, Antonio Callado, Clarival do Prado Valladares, Celso Antonio, Radamés Gnatalli, Francisco Mignone, José Olympio, Carlos Scliar, Maria Clara Machado, Alfredo Ceschiatti, Enrico Bianco, Augusto Rodrigues, José Paulo Moreira da Fonseca, Pietro Maria Bardi, – assim como a família do pintor – deram depoimentos que muito contribuíram para aprofundar a compreensão da vida e da obra de Portinari, bem como das preocupações estéticas, artísticas, culturais, sociais e políticas de sua geração.
A atuação sociocultural do Projeto Portinari se manifesta por meio da acessibilidade da obra do artista ao público. Isso inclui a realização da primeira exposição retrospectiva da obra de Portinari, ocorrida em 1997 no Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (MASP). Além disso, o Projeto se envolve na edição e/ou participação em publicações dedicadas a Portinari, na criação de materiais para divulgação da vida e da obra do artista, e no planejamento e execução do "Projeto Guerra e Paz". Este último envolveu a restauração dos painéis Guerra e Paz em um ateliê aberto a estudantes e ao público em geral, localizado no Palácio Gustavo Capanema, no Rio de Janeiro, e sua exposição no Rio de Janeiro (2010), São Paulo (2012), Belo Horizonte (2013), e Paris (2014). O Projeto Portinari ficou durante seis anos com a guarda dos painéis, devolvendo-os à ONU em 2015 em cerimônia presidida pelo próprio Secretário-Geral da ONU.
O projeto também realiza exposições no Brasil e no exterior, proporcionando uma ampla visibilidade da riqueza artística de Portinari.
A "primeira face visível" do Projeto Portinari foram as palestras proferidas por seu diretor-geral, o professor João Candido, em todo o território brasileiro, e no exterior, e que continuam se realizando até o presente momento. Para se ter uma ideia do seu alcance e importância, citamos apenas um exemplo: quando a Universidade da Califórnia inaugurou o "Berkeley Mulltimedia Research Center" (um empreendimento de 30 milhões de dólares), em 1995, ela o fez com uma única palestra: a do Projeto Portinari, proferida pelo professor João Candido. Durante a pandemia, foram por ele realizadas 84 "lives" (em outra seção aqui do nosso Portal estão relacionadas todas estas palestras e lives).
No âmbito socioeducativo, o Núcleo de Arte-Educação e Inclusão Social do Projeto Portinari desenvolve iniciativas de ensino-aprendizagem que estabelecem uma estreita conexão entre a obra de Portinari e os fundamentos de uma cultura de paz. Dentre essas ações, destacam-se a exposição itinerante 'O Brasil de Portinari', o projeto 'Se eu fosse Portinari', as exposições 'Portinari – Arte e Ciência' e 'Tempo Portinari', o projeto 'Portinari – Arte e Meio Ambiente', o programa educativo do 'Projeto Guerra e Paz', e o projeto 'Portinari – Bauzinho do pintor'. Na primeira edição, dedicada à literatura, a obra do artista é contextualizada com o livro 'Menino de Engenho', de José Lins do Rego, enquanto a segunda associa a pintura de Portinari a questões ambientais. Essas iniciativas buscam não apenas educar, mas também promover valores fundamentais para a construção de uma sociedade mais pacífica e inclusiva.
É relevante destacar que, desde a sua origem no âmbito científico da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RIO), o Projeto Portinari tem se dedicado à interação com diversas áreas do conhecimento, especialmente aquelas relacionadas à ciência e tecnologia. O objetivo é desenvolver e ajustar metodologias e técnicas inovadoras que possam ser benéficas para pesquisadores e instituições envolvidas em projetos semelhantes, como o 'Projeto Pincelada', por exemplo, dedicado à grave questão da ação dos falsários, que envolveu pesquisadores de diversos departamentos da área de ciência e tecnologia da Universidade. Essa abordagem reflete o compromisso contínuo do Projeto em contribuir para a expansão do conhecimento e aprimoramento das práticas em diversas esferas interdisciplinares.
Em reconhecimento ao trabalho que desenvolve, o Projeto Portinari conta atualmente com o patrocínio das empresas Enauta Energia, Instituto Cultural Vale, Faros Private, Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro; e os apoios do Ministério da Cultura, da PUC-Rio e da Portinari Licenciamentos,
Do poeta Carlos Drummond de Andrade o Projeto Portinari mereceu as seguintes palavras: "Trabalham discretamente os executantes do Projeto, mas deve cercá-los a confiança e o carinho dos que pensam no Brasil de amanhã nascendo do espírito e das mãos dos brasileiros de hoje."
É fundamental mencionar que o Projeto Portinari não teria chegado aonde chegou sem a colaboração e o empenho dos pesquisadores e profissionais que, com seu trabalho, contribuíram para a criação de seu acervo, mais amplamente, para o seu desenvolvimento em suas diversas áreas de atuação. E, também, sem o decidido apoio de toda a sociedade brasileira, inclusive por meio de suas entidades públicas e privadas, por demais numerosas para citarmos nominalmente aqui.